Divórcio em 2025: divórcio direto, cartório com filhos menores e proteção patrimonial do cônjuge mais vulnerável


Casal assinando documentos de divórcio em cartório, com anéis de casamento e balança da justiça sobre a mesa.

Introdução

Em 2025, divorciar-se no Brasil é, ao mesmo tempo, mais simples do que há alguns anos e mais complexo do ponto de vista estratégico. A simplificação veio com a Emenda Constitucional n.º 66/2010, que transformou o divórcio em verdadeiro direito de não permanecer casado, eliminando a exigência de prévia separação judicial. Esse entendimento foi confirmado pelo Supremo Tribunal Federal ao julgar o Tema 1.053 da repercussão geral, sob relatoria do ministro Luiz Fux.

Paralelamente, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) avançou na desjudicialização, permitindo que divórcios consensuais, inventários e partilhas sejam realizados em cartório mesmo quando há filhos menores ou herdeiros incapazes, desde que observadas salvaguardas específicas, previstas na Resolução n.º 571/2024.

Ao mesmo tempo, os dados do IBGE revelam crescimento do número de divórcios: em 2023, foram contabilizados cerca de 440,8 mil divórcios no país, 4,9% a mais que em 2022. Esse cenário torna indispensável compreender quando o cartório é suficiente, quando o Judiciário ainda é necessário e como proteger economicamente o cônjuge mais vulnerável após a dissolução do casamento.

1. O divórcio como direito potestativo após a EC 66/2010

A Emenda Constitucional n.º 66/2010 alterou o § 6.º do art. 226 da Constituição Federal para prever, de forma direta, que o casamento pode ser dissolvido pelo divórcio, sem exigir prazos ou etapas intermediárias. A partir daí, consolidou-se a ideia de que o divórcio é um direito potestativo: basta a manifestação de vontade de um dos cônjuges, independentemente de culpa ou concordância do outro.

No julgamento do RE 1.167.478/RJ (Tema 1.053), o STF fixou tese clara: a separação judicial não é mais requisito para o divórcio e tampouco subsiste como figura autônoma, preservando-se apenas o estado civil de quem já se encontra separado por decisão judicial ou escritura.

Esse entendimento reforça algumas consequências práticas importantes:

não é necessário demonstrar motivo para o divórcio; não se discute “culpa” como condição para dissolução do vínculo; discussões sobre guarda, alimentos e partilha podem ser resolvidas conjuntamente, mas não impedem o decreto do divórcio.

A leitura constitucional privilegia a autonomia e a dignidade da pessoa, valores constantemente realçados pela jurisprudência do STF em matéria de Direito de Família.

2. Divórcio em cartório em 2025: quando é possível?

Desde a Lei n.º 11.441/2007, já era possível realizar divórcio consensual em cartório, sem processo judicial, desde que não houvesse filhos menores ou incapazes e que todas as questões patrimoniais estivessem pacificadas. A Resolução n.º 35/2007 do CNJ estruturou os procedimentos para a via extrajudicial.

Em 2024, o CNJ deu passo adiante com a Resolução n.º 571/2024, autorizando que inventários, partilhas e divórcios consensuais possam ser feitos em tabelionato de notas mesmo havendo herdeiros menores ou incapazes, desde que a solução não envolva disposição de bens em prejuízo desses interessados e haja manifestação favorável do Ministério Público.

Na prática, o divórcio em cartório, em 2025, exige atenção a alguns requisitos:

Consenso entre os cônjuges sobre: vontade de se divorciar; regime de guarda e convivência dos filhos; alimentos para filhos e, se for o caso, para ex-cônjuge; partilha de bens e eventuais dívidas.Assistência obrigatória de advogado ou defensor público para ambos ou para o casal.Inexistência de litígio relevante: se houver conflito grave sobre guarda, violência doméstica, alienação parental ou controvérsias patrimoniais de maior complexidade, o tabelião deve recusar o ato e orientar a busca do Judiciário.No caso de filhos menores ou incapazes: necessidade de estruturação de acordo que resguarde integralmente o interesse das crianças; manifestação favorável do Ministério Público; vedação à disposição de bens pertencentes ao menor ou incapaz, salvo autorização judicial específica.

Desse modo, o cartório passa a ser uma porta de saída célere para casais que conseguem dialogar, inclusive quando há filhos menores, desde que as garantias legais sejam efetivamente observadas.

3. Quando o processo judicial ainda é o caminho adequado

Apesar do avanço da desjudicialização, há situações em que a via judicial continua indispensável ou, ao menos, prudente:

Conflitos intensos sobre guarda, convivência ou mudança de domicílio de filhos menores, com alegações de risco, violência ou alienação parental;Violência doméstica e familiar, que exigem medidas protetivas, afastamento do lar e atuação coordenada com o sistema de Justiça criminal;Desacordo sobre partilha de bens, especialmente em casamentos com grande patrimônio, empresas familiares, sociedades empresariais ou bens no exterior;Indícios de manipulação, coação econômica ou assimetria extrema de informação, em que um dos cônjuges não tem plena consciência das consequências do acordo proposto.

Nesses casos, o Judiciário funciona como espaço de garantia de contraditório e instrução probatória, mitigando desigualdades de poder entre as partes. A atuação prudente do advogado, aqui, consiste em avaliar se a celeridade do cartório não implicará renúncias irrecuperáveis para o cônjuge mais vulnerável.

4. Proteção patrimonial do cônjuge economicamente vulnerável

4.1. Regime de bens e partilha

O ponto de partida é o regime de bens adotado no casamento (comunhão parcial, comunhão universal, separação convencional ou obrigatória, participação final nos aquestos). Cada regime define:

quais bens integram a meação; se há ou não comunicação de bens anteriores ao casamento; como se tratam heranças, doações e aquisições onerosas durante a união.

A correta identificação dos bens comuns e particulares, com lastro documental (matrículas, contratos, extratos bancários), é essencial para qualquer acordo de divórcio que pretenda ser estável e reduzir litígios futuros.

4.2. Alimentos x alimentos compensatórios

O STJ vem consolidando, há alguns anos, a distinção entre:

pensão alimentícia tradicional (art. 1.694 do Código Civil), voltada à subsistência de quem não pode prover o próprio sustento; ealimentos ou pensão compensatória, voltados a corrigir grave desequilíbrio econômico criado pela ruptura do vínculo conjugal, como ocorre quando um dos cônjuges abandona a carreira para se dedicar ao trabalho doméstico e ao cuidado dos filhos.

Em precedente frequentemente citado, o STJ destacou que esses alimentos compensatórios não se confundem com a pensão alimentícia tradicional, pois buscam mitigar a abrupta alteração do padrão de vida de quem sai do casamento sem patrimônio ou renda, após anos de contribuição não remunerada ao projeto familiar.

Mais recentemente, a Quarta Turma do STJ manteve condenação que fixou alimentos compensatórios de R$ 4 milhões em favor de ex-companheira, justamente para recompor o desequilíbrio econômico após longa união, em que ela usufruía gratuitamente imóvel e padrão de vida elevado.

Por outro lado, o mesmo Tribunal também tem ressaltado que:

nem todo divórcio justificará pensão compensatória; o instituto possui natureza indenizatória/compensatória, o que afasta, por exemplo, a prisão civil como meio de cobrança, reservada aos alimentos estritamente de subsistência.

Em síntese, a pensão compensatória:

exige demonstração concreta de desequilíbrio relevante; costuma ter prazo determinado ou ser fixada em parcela única; é avaliada caso a caso, com forte componente de equidade.

4.3. Economia do cuidado e valorização do trabalho doméstico

A doutrina contemporânea e estudos recentes têm insistido na necessidade de reconhecer o valor econômico do trabalho doméstico e de cuidado, em geral exercido de forma desproporcional por mulheres, sem remuneração e sem proteção previdenciária adequada.

Esse debate dialoga com a prática forense: ao analisar alimentos compensatórios, guarda compartilhada e divisão de encargos parentais, juízes e tribunais são chamados a considerar:

o impacto da maternidade e do cuidado sobre a trajetória profissional; a perda de oportunidades de carreira; a dependência econômica construída ao longo da união.

Nessa perspectiva, a proteção patrimonial do cônjuge vulnerável não é “privilégio”, mas mecanismo de correção de assimetrias estruturais, em linha com a compreensão de juristas como Luís Roberto Barroso e Flávio Dino acerca da centralidade da dignidade humana e da igualdade substancial nas relações familiares.

5. Passo a passo prático antes de escolher cartório ou Justiça

Antes de decidir se o divórcio será feito em cartório ou por ação judicial, é prudente que o casal (ou o cônjuge interessado) responda, com apoio técnico, às seguintes perguntas:

Há consenso real sobre o término do casamento e seus efeitos?Se um dos cônjuges se opõe frontalmente ou demonstra não compreender os impactos patrimoniais do acordo, a via judicial pode ser mais segura.O regime de bens e o patrimônio do casal estão claramente identificados?Matrículas atualizadas de imóveis, extratos bancários, contratos de veículos, quotas empresariais, aplicações financeiras.Existe assimetria econômica significativa entre os cônjuges?Um deles ficou fora do mercado de trabalho por longos anos para cuidar da casa e dos filhos? Há necessidade de discutir alimentos compensatórios ou partilha mais cuidadosa?Há filhos menores ou com deficiência ou doença grave?Em caso positivo, é necessário desenhar, com muita precisão, regras de guarda, convivência, pensão alimentícia e responsabilidades parentais. O cartório somente poderá atuar se houver plena proteção ao interesse dos filhos e manifestação favorável do Ministério Público.Há histórico de violência doméstica, abuso ou intimidação?Nessas hipóteses, a prioridade é a proteção da integridade física e psíquica da vítima; o divórcio judicial, com medidas protetivas, costuma ser o caminho adequado.

Responder a essas questões, preferencialmente com assessoria jurídica, evita acordos apressados que gerem arrependimento ou litígios posteriores.

6. Perguntas frequentes

  1. Em 2025 ainda existe separação judicial?O STF entendeu que, após a EC 66/2010, a separação judicial não é requisito para o divórcio e não subsiste como figura autônoma, preservando-se apenas a situação de quem já está separado por decisão ou escritura anteriores.

  2. Posso me divorciar em cartório mesmo tendo filhos menores?Sim, desde que o divórcio seja consensual, todas as questões de guarda, convivência e alimentos estejam bem definidas, não haja prejuízo aos filhos e o Ministério Público se manifeste favoravelmente, nos termos da Resolução n.º 571/2024 do CNJ.

  3. O cartório é sempre mais vantajoso do que o processo judicial?Nem sempre. O cartório é mais rápido quando há consenso e equilíbrio entre as partes. Porém, em situações de conflito intenso, desigualdade econômica ou necessidade de produção de provas, o processo judicial oferece maior proteção e controle.

  4. O cônjuge que nunca trabalhou fora tem direito automático a pensão compensatória?Não há “direito automático”. A pensão compensatória depende de prova do desequilíbrio concreto e das circunstâncias do caso. O STJ reconhece o instituto, mas também é rigoroso ao analisar sua necessidade, extensão e duração.

  5. Alimentos compensatórios podem ser cobrados com ameaça de prisão civil?A jurisprudência do STJ tem entendido que os alimentos compensatórios possuem natureza indenizatória/compensatória, e não estritamente alimentar, o que afasta, em regra, o rito da prisão civil, reservado à pensão de subsistência.

Conclusão

O divórcio em 2025 combina três tendências: (i) liberdade individual de não permanecer casado, reforçada pela EC 66/2010 e pelo STF; (ii) desjudicialização responsável, com ampliação da via extrajudicial inclusive em cenários com filhos menores, sob a supervisão do Ministério Público; e (iii) sensibilidade crescente à proteção patrimonial do cônjuge vulnerável, por meio da correta aplicação dos regimes de bens, da partilha equilibrada e, quando cabível, da pensão compensatória.

Para quem vive essa realidade, a principal mensagem é de prudência: não basta escolher o caminho mais rápido, é essencial escolher o caminho mais seguro para o patrimônio, para os filhos e para a reconstrução da vida pós-divórcio. A análise individualizada, conduzida por advogado de confiança, continua sendo o melhor instrumento para transformar as garantias abstratas do sistema jurídico em proteção concreta no caso concreto.